Com sátira social, personagens icónicas e uma história cultural imbatível, The Simpsons continua a marcar gerações, mesmo após mais de três décadas nas nossas televisões e não só.
Há poucas séries, muito poucas mesmo, que conseguem reivindicar um lugar tão sólido na cultura pop global como The Simpsons. Criada por Matt Groening, a família amarela de Springfield estreou a 17 de dezembro de 1989, revolucionando a televisão e o conceito de animação para adultos. Com um humor ácido e uma crítica social afiada, The Simpsons tornou-se numa referência incontornável para várias gerações, acumulando histórias e episódios que espelham — com humor e inteligência — a sociedade americana e as suas contradições.
A Origem
A origem de The Simpsons remonta a esboços que Matt Groening desenhou em poucos minutos, quando foi chamado para criar uma série de curtas para o programa The Tracey Ullman Show, em 1987. A família, composta por Homer, Marge, Bart, Lisa e Maggie, rapidamente conquistou o público, levando à produção de uma série completa, que viria a estrear na FOX. Nota-se, aliás, toda evolução dos desenhos das primeiras temporadas para as seguintes, onde as personagens surgem com maior detalhe e mais qualidade. O seu sucesso foi tão estrondoso que acabou por influenciar toda uma nova vaga de séries animadas destinadas ao público adulto, como Family Guy e South Park.
As Personagens
A força de The Simpsons reside, em grande parte, nas suas personagens memoráveis. Homer Simpson, o pai desajeitado e propenso a gafes, é o retrato de um trabalhador americano médio, mas com um carisma que transcende a comédia física. Marge, a esposa dedicada de cabelo azul, representa a base emocional da família, enquanto Bart, o eterno delinquente de dez anos, encapsula o espírito rebelde. Lisa, com a sua inteligência precoce e ativismo social, contrasta com o conformismo da sua cidade e Maggie, o bebé silencioso, tem um papel surpreendentemente dinâmico em momentos cruciais.
A série também é rica em personagens secundárias que, ao longo dos anos, ganharam vida própria. Desde o cínico bartender Moe Szyslak, até ao magnata implacável Montgomery Burns, passando pelas irmãs Patty e Selma e pelo Chefe Wiggum (a presença da autoridade na série) e o (demasiado) simpático vizinho Flanders, o Palhaço Krusty e Sideshow Bob, o eterno vilão de Bart, em que cada figura contribui para o tecido narrativo de Springfield, quase como um microcosmo da sociedade americana.
As Expressões
Há muito poucas séries que se podem gabar de ter criado expressões que se tornaram universais. O grito “D’oh!” de Homer foi adicionado ao Oxford English Dictionary, destacando o impacto cultural da série. Outras expressões como “Eat my shorts!”, “Cowabunga” ou “Ay caramba!” de Bart, “Excelent!” do Sr. Burns, o famoso “Yuhuu!” de Homer ou até o riso gozão “Ha! Ha!” de Nelson Muntz, são igualmente icónicas, simbolizando a irreverência que caracteriza The Simpsons.
O Genérico
A inesquecível sequência de abertura de The Simpsons é um dos elementos mais reconhecíveis da série. A maioria dos episódios inicia-se com a câmara a mover-se do título do programa para uma visão aérea da cidade de Springfield, acompanhando os membros da família enquanto cada um segue o seu caminho de volta a casa. O momento culmina com os Simpsons a sentarem-se no sofá da sala para ver televisão. A música, um dos aspetos mais emblemáticos, foi composta por Danny Elfman, em 1989, depois de Matt Groening lhe ter pedido uma composição com um toque retro. Elfman chegou a afirmar que esta melodia se tornou a peça mais popular da sua carreira.
O que torna a abertura ainda mais especial são as três variações que mudam de episódio para episódio. Primeiro, Bart escreve sempre frases diferentes no quadro da escola. Segundo, Lisa toca solos distintos no saxofone, exceto nas primeiras temporadas, onde o solo era sempre o mesmo. Por fim, as cenas em que a família entra na sala de estar e se senta no sofá apresentam uma grande diversidade de situações. A 15 de fevereiro de 2009, a série estreou uma nova sequência de abertura para acompanhar a transição para alta definição (HDTV), mantendo os elementos clássicos mas enriquecendo a sequência com novos detalhes e personagens, adaptando-se à era moderna sem perder a essência original.
Os Episódios
Ao longo dos mais de 750 episódios, The Simpsons ofereceu uma vasta gama de episódios, desde paródias brilhantes até críticas políticas contundentes. Episódios como Homer vs. The Eighteenth Amendment (em que Homer se torna contrabandista durante uma nova Lei Seca em Springfield) são exemplos de como a série aborda questões sociais com humor. Marge vs. the Monorail, escrito por Conan O’Brien, é considerado um dos melhores episódios de sempre, misturando humor absurdo com uma mensagem ambiental.
A série também tem igualmente episódios especiais, que se tornaram tradição, como as antologias de terror Treehouse of Horror, exibidas todos os anos no Halloween ou episódios especiais de Natal, bem como outras épocas festivas. Estes episódios quebram as regras da continuidade e exploram temas assustadores e sobrenaturais, trazendo à série um toque ainda mais criativo.
As (35) Temporadas
É inegável que as primeiras temporadas de The Simpsons são amplamente consideradas as melhores, com um humor sofisticado e narrativas bem trabalhadas. À medida que a série avançou, as críticas tornaram-se mais frequentes, com muitos fãs a argumentar que a qualidade narrativa decaiu. No entanto, a série conseguiu adaptar-se aos tempos, abordando temas modernos como redes sociais, fake news e cultura do cancelamento, mostrando a sua capacidade de reinvenção e adaptação a um mundo em constante evolução.
A Controvérsia
Com o seu humor provocador, The Simpsons não esteve isenta de polémicas. O episódio Stark Raving Dad, que contava com a voz de Michael Jackson, foi removido do ar após as alegações contra o cantor. A personagem de Apu Nahasapeemapetilon também gerou debate, com acusações de perpetuar estereótipos raciais. Apesar das críticas, a série foi pioneira ao incluir temas que outros programas evitavam, desde a sexualidade à corrupção política.
No panorama global, The Simpsons ganhou um lugar especial, com episódios que parodiam outros países e a própria cultura americana. Em Portugal, a série encontrou uma base de fãs leal desde a sua estreia na televisão nacional, influenciando o humor e as referências culturais.
As Profecias
A série tem intrigado fãs e críticos ao longo dos anos, com várias cenas e piadas que acabaram por se materializar no mundo real. Embora muitas dessas previsões possam ser atribuídas a coincidências ou à inteligência perspicaz dos seus argumentistas, a sua precisão levanta questões fascinantes sobre o impacto cultural da série.
- A Eleição de Donald Trump (2000): Um dos exemplos mais famosos de previsões de The Simpsons é a eleição de Donald Trump como presidente dos Estados Unidos. No episódio “Bart to the Future”, exibido em 2000, Lisa Simpson torna-se presidente e refere-se à administração de Trump como um desastre económico que herdou. Em 2016, Trump foi de facto eleito presidente, acabando esta previsão por se tornar um dos momentos mais discutidos da série.
- O Escândalo de Espionagem da NSA (2007): No filme The Simpsons Movie, de 2007, uma cena mostra Marge e a sua família a serem espiados pela NSA, um toque humorístico que satirizava o crescente controlo governamental. Anos mais tarde, em 2013, Edward Snowden revelou o escândalo de espionagem massiva da NSA, o que levou muitos a apontar que The Simpsons tinha antecipado um dos maiores escândalos de vigilância global da era moderna.
- Aparecimento de Smartwatches (1995) No episódio Lisa’s Wedding, de 1995, um dos personagens usa um dispositivo semelhante a um smartwatch para fazer chamadas. Esta ideia, completamente futurista na época, tornar-se-ia realidade em 2014, com a popularização dos relógios inteligentes.
- O Escândalo da FIFA e a Vitória da Alemanha no Mundial (2014): No episódio You Don’t Have to Live Like a Referee, transmitido em 2014, Homer é contratado para arbitrar a final do Mundial e a série menciona a corrupção na FIFA. Meses depois, a verdadeira FIFA esteve envolvida num escândalo de corrupção de grande escala, que resultou em várias prisões de altos responsáveis da organização. Além disso, o episódio previa a vitória da Alemanha no Mundial de 2014, o que também se confirmou.
- O Surto de Ebola (1997): Em Lisa’s Sax, um episódio de 1997, Marge tenta animar Bart, mostrando-lhe um livro intitulado Curious George and the Ebola Virus. Embora o vírus Ebola já existisse há décadas, um dos piores surtos aconteceu em 2014, levando muitos a recordar essa estranha referência num episódio antigo. Algo muito semelhante, acabaria por acontecer também com a Pandemia de Covid-19.
- A Compra da 20th Century Fox pela Disney (1998): Outro exemplo intrigante é de 1998, quando um episódio mostrava que a 20th Century Fox era propriedade da Walt Disney Company. Esta previsão tornou-se realidade em 2019, quando a Disney adquiriu a 20th Century Fox num dos maiores negócios da história da indústria do entretenimento.
O Filme
Lançado a 27 de julho de 2007, The Simpsons Movie era aguardado com grande antecipação e os números de bilheteira não dececionaram. O filme arrecadou mais de 536 milhões de dólares mundialmente, tornando-se um dos filmes de animação mais rentáveis da época. A narrativa gira em torno de Homer que, após causar um desastre ambiental em Springfield, vê a cidade isolada sob um domo gigante. A história explora questões ambientais, sátira política e, claro, a dinâmica hilariante da família Simpson.
Os críticos e fãs aplaudiram o filme pelo seu humor afiado e pela capacidade de manter a essência da série enquanto aproveitava a escala cinematográfica para criar momentos visualmente impressionantes. Desde a cena de abertura, ao porco de estimação de Homer, “Spider-Pig”, que até música teve direto, até à crítica social embutida no enredo, o filme conseguiu equilibrar nostalgia com novidade, agradando tanto aos fãs antigos como ao público mais jovem.
Merchandising
O sucesso de The Simpsons não se limita apenas ao ecrã. A série gerou um vasto império de merchandising, que inclui desde bonecos, LEGO, t-shirts a itens de colecionador e produtos alimentares, como a famosa “Duff Beer” e os “Donuts do Homer”. Este universo de produtos ajudou a transformar The Simpsons num dos franchises mais lucrativos da cultura pop.
Os Videojogos
Os videojogos inspirados em The Simpsons são outra peça fundamental deste império. O primeiro jogo, The Simpsons: Bart vs. the Space Mutants, foi lançado em 1991 e a série desde então gerou uma série de títulos que abrangem várias plataformas. Um dos mais populares é The Simpsons: Hit & Run (2003), um jogo de mundo aberto inspirado em Grand Theft Auto, onde os jogadores exploram Springfield em várias missões hilariantes.
Outro jogo significativo é The Simpsons Game (2007), lançado em conjunto com The Simpsons Movie. O jogo oferecia uma aventura cheia de referências a episódios icónicos, personagens secundárias e paródias ao próprio mundo dos videojogos, mostrando o quão bem a série se adaptava a este meio interativo.
Até quando…
Após mais de 35 anos no ar, The Simpsons continua a inovar e a desafiar expectativas. Embora muitos se perguntem quanto tempo a série poderá durar, os criadores continuam a garantir que Springfield ainda tem muitas histórias para contar.
The Simpsons não é apenas uma série de animação; é um espelho distorcido e hilariante da humanidade. A sua longevidade não é só uma questão de humor, mas da capacidade única de capturar as complexidades do mundo em constante mudança. Como diria Bart, “Don’t have a cow, man!” — ainda há muito por explorar na cidade mais peculiar da televisão.
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